quinta-feira, 8 de março de 2012

Raoul Henry conta sua trajetória como aluno, professor e pesquisador

Nascido na Bélgica, Raoul Henry, veio com a família para Botucatu, em 1962. No início, ele passou a residir na Fazenda Monte Alegre.  Após concluir o atual Ensino Médio que, na época, era denominado “científico”, ele ingressou na Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu (FCMBB), em 1969.
Também foi o primeiro doutorando da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) a defender tese na instituição. Atuou por 10 anos como editor chefe da Revista Acta Limnologica Brasiliense e foi presidente da Sociedade Brasileira de Limnologia. 
Em entrevista concedida ao Jornal do IB, ele conta como foi ser estudante da FCMBB e depois passar a atuar como professor, atividade que desempenha desde 1974, além de abordar sua atuação na área de pesquisa e  de extensão.

Quando o senhor veio para Botucatu e como foi seu ingresso no curso de Ciências Biológicas?

  De 1950 a 1960, eu morei na África. Em 1960, ocorreu a independência do Zaire. O Zaire, ex-Congo Belga, era uma colônia da Bélgica. Após a independência a família voltou para a Bélgica. A Bélgica comprou uma fazenda em Botucatu, Fazenda Monte Alegre. Na realidade, era para fazer uma cooperativa. Meu pai entrou (trabalhar) aqui e, desde 1962, eu estou no Brasil, em especial aqui em Botucatu. Quando eu cheguei aqui não sabia falar nada de português, tive que aprender a língua, aprender a escrever.   Aí fiz o científico que agora é Ensino Médio. Fiz vestibular e entrei aqui na faculdade, na época chamava Faculdade de Ciências Médicas e Biológicas de Botucatu.
Eu morava em pensão. A Faculdade era bem menor que hoje e, na época de aluno, nós tínhamos melhor interação entre professor e estudante. O câmpus era bem menor, não havia todos esses prédios. Então, isso facilita também o contato. Quanto maior, mais amplo, a probabilidade de encontro diminui. Isso é normal.
Fiz a faculdade, me formei, aí fiz um ano de estágio na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e depois, então, fiz concurso e entrei como professor.


E quanto aos movimentos estudantis?

Eu não participei muito. Era a época da chamada ditadura e a gente estava fazendo um movimento e eu era estrangeiro, ainda não era naturalizado, como era representante de classe e tinha o famoso decreto 477, eu fui consultar lá para não ter problema porque expulsavam os estrangeiros. A gente sabia que tinha um funcionário que trabalhava na seção de protocolo que era vigilante, vamos dizer assim.  Eu participei da regulamentação da profissão de biólogo. Aqui, por influência da Faculdade de Medicina, era mais voltado à Biomedicina. Foi um grande avanço quando se pôde, no Instituto de Biociências, dividir os cursos nessas duas linhas: Ciências Biológicas e Ciências Biomédicas.

Raoul em Minas Gerais 
Como foi passar de estudante para professor?

Eu me formei com uma especialidade. Você vai fazendo estágio durante sua graduação e aí caiu na mão um livro sobre Ecologia e não tinha essa disciplina. Aí eu fui fazer um estágio na UFSCar (Universidade Federal de São Carlos). Fiz um ano e quando terminei esse estágio fui contratado porque essa disciplina passava a ser obrigatória no currículo de Biologia. Eu também fui indicado porque era estagiário aqui no Departamento de Zoologia. Até 1984 era lá onde hoje é a Cardiologia. Mudamos para cá porque esses dois prédios pertenciam à Agronomia e a Agronomia mudou para o Lageado.

Gostaria que falasse sobre sua atuação na área de pesquisa. Quais os principais resultados que obteve ao longo dos anos?

 A minha área de pesquisa é Ecologia de águas continentais. Então, quando eu fui contratado aqui, a primeira pesquisa que eu fiz, o meu mestrado, foi sobre a represa do Rio Pardo, o “Véu da Noiva”. Tem uma cascata lá e tem uma represa lá em cima. E de doutorado eu fiz em Minas Gerais e em São Carlos.  A represa é um ambiente que difere de lago, um ambiente de transição, e você tem represas que têm diferentes portes e volumes de água. Então, você tem ambientes que se comportam quase como rios, como, por exemplo, a Represa “Véu da Noiva” e represas que são parecidas com lagos como a Represa Jurumirim. Você tem gradiente de condições muito distintas de lagos e represas. Lago é considerado como um ambiente praticamente estável. Todos os grandes rios estão sendo transformados em represas. Modifica a estrutura da comunidade de peixes, tem alguns que são adaptados à água corrente enquanto que outros não. Então, desorganiza tudo e forma-se um novo equilíbrio, mas tem todo um período de transição. Trabalhei bastante em projetos de represas. Vou fazer compilação de dados na Represa de Jurumirim, em Paranapema, onde trabalho desde 1988 e vou fazer a síntese dos dados.
Ao longo de minha carreira eu fui publicando, eu fui sendo conhecido. Fui presidente da Sociedade Brasileira de Limnologia.

O senhor chegou a participar da Operação Sueste, em 1983. Que lembranças tem desse trabalho?

Naquela época, o Instituto achou que era bom os alunos terem contato com a vida marinha. E tinha um professor, já falecido, da Biofísica (departamento), que tinha uma interação muito grande com a Universidade Federal do Paraná, em Curitiba, que possui um câmpus avançado no litoral do Paraná e, naquela ocasião, surgiu uma oportunidade, através desse professor, Pedro Luchiari, de participar de uma viagem num navio oceanográfico. Aí foram algumas alunas, eu, o Gilson (Volpato). Como eu trabalhava com águas continentais, queria ter essa experiência de participar pelo menos uma vez de uma viagem oceanográfica na costa no Paraná.
Mostrou-se como coletava um plâncton marinho, a fauna de fundo do mar com arrasto, que eu faço em lagoas. E era esse o projeto. Embarcamos nesse navio, ficamos lá uma semana participando. Era da Marinha. Fizemos alguns experimentos.


Também gostaria que comparasse ensino, pesquisa e extensão atualmente em relação ao começo de sua carreira.

Você tem muito mais exemplos, estudo de casos para apresentar aos alunos, não fica só em livros. Agora tem uma massa de informação bastante grande. Quando você mostra um problema ao seu lado, eu acho que é mais fácil ensinar. 
Eu estou fazendo extensão na tentativa de melhoria de Ensino Fundamental e Médio e tive a participação em um projeto que envolveu professores e alunos em Angatuba, onde eu trabalho na Represa de Jurumirim. Como eu conhecia melhor aquela região, achei que era melhor envolver o pessoal. A primeira fase desse projeto nós convidamos professores e alunos da rede municipal de ensino para visitar o local e ver como que fazemos o estudo em águas. Numa segunda fase, alguns professores queriam um projeto com participação mais efetiva. Para reconhecimento da qualidade de água que desemboca naquela área, para conhecerem um problema do cotidiano. Eram 10 professores e em torno de 60 alunos. Eu acho que isso é bom. De um lado para os alunos de mestrado e doutorado é bom porque tomam contato com a realidade e ganham experiência de ensino para uma turma mais jovem. E, para os alunos do Ensino Fundamental e Médio, eles têm contato com o pessoal da universidade porque para eles a universidade está tão longe. Aí perguntam coisas sobre o futuro, perspectivas, quais as melhores universidades, cursos.

O professor durante a Operação Sueste, no Paraná
                                             

Nenhum comentário:

Postar um comentário